sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Assim que chega à escola, Sérgio mostra para a professora e colegas que aprendeu a “fazer os passos do Justin Bieber”. Ok, deve ser febre de adolescente, aparece nos assuntos mais comentados no Twitter e sei lá mais onde. Nada demais, certo?

Errado.

O menino em questão acabou de completar seis anos, é boliviano e meu aluno.

Os tempos são outros e a gente não tem real dimensão disso até que o peculiar pule e rebole na sua frente, e com sotaque espanhol. Melhor que isso só as minhas alunas cantando (enrolando) alguma coisa da Lady Gaga. A mídia, a globalização ou sei lá o quê não poupa ninguém.

Até então eu achava que meus alunos estavam protegidos, ouvindo só Palavra Cantada e histórias do Ziraldo. Mas que nada! O mundo é cruel, devora, sexualiza e emburrece, por mais que a gente caminhe e se esforce na direção contrária. Aquilo que é próprio da infância deixou de ser importante, e ficar mais próximo ao irmão adolescente, seja nos assuntos ou nas roupas é cada vez mais freqüente. Pra mim, é a concretização do que escreveu Neil Postman em O desaparecimento da Infancia, de não haver mais distinção entre o mundo adulto e o infantil, da ausência do “segredo” que seria pouco a pouco desvelado pela criança no seu processo de aquisição da escrita e inserção no mundo dos letrados.

Aos seis anos também ia pra escola e dançava coisas da Xuxa, que hoje sei que não é nada educativo. Mas tinha o Balão Mágico, o Raulzito, o Sítio do Pica Pau Amarelo e todas as músicas do cancioneiro infantil. Em casa, os sucessos da rádio AM, incluindo todo um vasto repertório do clássico brega (“princesaaaaa, a musa da minha poesiaaaa, os meus olhos querem te vê-er!”). E só.

Só soube o que era uma boy band (ou modinha, ou não sei o nome disso) com o New Kids on the Block, no começo da adolescência. E parou ali.

Daí que quando fui dar aulas para adolescentes entendi que, embora efetivamente a minha idade não fosse tãããão distante da deles, meu repertório de vivências era. E de que eu não sei nada sobre o mundinho pop (graças a deus!) e tenho até ojeriza a ele e a gente que tem poster da Britney, Mariah Carey ou da Lady Gaga (que até bem pouco tempo eu acreditava se tratar de uma drag queem). Eu não tenho estomago pra isso, sabe?

Meus alunos sabem quem é Lady Gaga e Justin Bieber. Usam internet e me chamam pra a vizinhança do Fazenda Feliz.

E eu aqui, Dona Aranha...

PS: o mundo está perdido? NÃO! Lembro perfeitamente do sucesso que fazia meus CDs com Jorge Ben e Clube do Balanço.

PS2: eu esperava que meus alunos bolivianos carregassem com orgulho símbolos/objetos/qualquer coisa que os identificasse enquanto grupo étnico. Mas que nada! Tirando as cholitas (as avós de cabelo longuíssimo, saia longa e colorida) todos eles fazem um grande esforço para se “abrasileirar”. Uma pena.

3 comentários:

kell disse...

me causa arrepios imaginar que tipo de adulto essas crianças se transformaram.

belo blog!

kell disse...

menina..juro que não lembro o nome, mas é colado ao mc donalds do metrô são joaquim, sem erro.

e a melissa eu nem comprei na promoção, valor integral por um sapato careca.

RICARDO MANN disse...

Telma, adorei esse seu texto! Entrei aqui e parei... Muito disso é culpa também dos pais. Parece que não querem deixar a criança ser criança. Faça sua parte como educadora e tenha esperança...