segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

S o b r e p e s o

Eu sempre fui assim.

Está lá, nas fotos de família: bochechuda, calça colada, moletom apertado, sorriso aberto. É bonitinho uma criança gorda. Como nunca houve nenhuma orientação médica no sentido contrário, a mãe sempre achou que eu era a filha mais linda do mundo. As dobrinhas a mais não era resultado de má alimentação, muito pelo contrário: sempre fui fã dos vegetais.

Daí eu cresci.

Precisei comprar roupa sozinha. E entendi que o mundo foi feito para o manequim 38.

Auto estima lá no pé, demorei pra beijar, pra namorar. Aos 19 usava apenas roupas larguíssimas, vestidos ripongas, sabe? Entrei na faculdade, saí de casa, arrumei um namorado. Num ambiente novo e hostil precisamos ser fortes&seguras, ou o mundo nos devora. Fiz a primeira opção. E tudo pareceu bem, até o namorado passar a mão no teu quadril, na tua barriga e dizer: “se você perdesse um pouquinho disso aqui você ficaria uma delicia”.

Acabou. Bem, não foi por isso que acabou, mas foi isso que ficou na memória: ser recusada, do modo como era, pela pessoa que mais amava.

Mas, mesmo gorda&feia, por algum motivo misterioso, os homens se aproximavam de mim. Entendi, a duras penas, que aparência é uma coisa do jogo de encantar os homens, mas não é toda a coisa, entende? Inacreditavelmente eu nunca fiquei sozinha: sempre tive a sorte de ter um cara bacana me segurando a mão

Mulher é um bicho estranho e, mesmo muito segura do que era e do que poderia fazer, um outro moço, a quem dediquei meu amor, me chamou de ‘gordita”(si, hablava espanhol). Morri. Pirei. E acho que essa foi a coisa mais pesada que fiz na minha vida: parei de comer. Sério: passava um dia inteiro com apenas UMA refeição, algo do tipo um potinho de tabule, e nada mais. Entre uma fome e outra, café com adoçante. Caminhadas l o n g a s do trabalho até em casa. Cerveja nos finais de semana com os amigos, e só cerveja, sem nenhum petisco. E dedo na garganta, pra completar o panorama de maluca. O tal moço? Sumiu. Eu fiquei com a dor.

Mas aí apareceu um outro que acha graça naquilo que sobra, que gosta da imagem e tem o habito de recortá-la pra si, sem pudores, que não se importa nenhum pouco com as meninas de manequim 38. Só aos 28 anos tive coragem de usar shortinho jeans, usar biquini e ousar no decote. Incrível, não?

Tirando as crises decorrentes da TPM, a vida vai bem: sem maiores transtornos, com chocolate compartilhado no meio da noite e jantares gostosos a dois.

(em tempo: pra quem nunca me viu na vida, não, eu não sou REALMENTE gorda, mas não entro num manequim 40 e tenho dificuldades de comprar biquínis)

Nenhum comentário: